Há três dias estava eu no Estádio da Luz a assistir ao concerto magistral do Ed Sheeran, mas só agora tive oportunidade e capacidade para partilhar isto publicamente. Pela segunda vez, fui a um concerto sozinha, visto que a Everything Is New (EIN) ainda não se dignou a resolver a situação da entrada do acompanhante, que logicamente deve ser gratuita. Estava ciente dos riscos: muitas horas sozinha (sem comer nem ir à casa de banho), num estádio de futebol esgotado com cerca de 60 mil pessoas, etc. Mas, lá fui.
Eu não me suporto, tu não me suportas, ele não me suporta. Nós não nos suportamos, vós não me suportais, eles não me suportam. Nada me suporta, porra. E eu, nada suporto. Não suporto os meus ossos, os meus órgãos, o meu cérebro. Não suporto o meu corpo, o meu ser. Nem tão pouco os meus pensamentos, sentimentos e emoções. Sou flácida, fraca, frágil. Tenho medo, preguiça e raiva. E ódio, muito. Odeio muito. Eu, muito odeio. Odeio que me digam que não há solução, que não há alternativa ou esperança. Odeio o pessimismo e o realismo desumano. Não suporto que me mandem calar. Como aquele... aquele que hoje me disse que não valia a pena. Aquele que afirmou que eu tinha uma doença degenerativa. Aquele que achou que não fazia sentido eu fazer mais fisioterapia. Que não se justificava, que nunca me iria curar ou ser útil.
Um crescimento precoce, uma cirurgia, um adeus à marcha, um olá à reabilitação. Esse aí, o Serviço Nacional de Saúde, mais se parece com uma chupeta. Daquelas amargas que se dá ao povo para ele parar de chorar e ofuscar a sua visão. Contudo, não são precisas lágrimas para se chorar ou sofrer. Os profissionais de saúde, muitos deles, sabem cozer, mas não conhecem o paladar. Sabem fazer, mas não sabem ser. Sabem ler, mas não sabem escrever. Sabem conhecimento, mas não sabem as pessoas. Não sabem falar, abraçar, cativar. Muitas vezes, são máquinas revestidas de pele humana. Carecem do saber de cativar.
Eu cá tento ser suportável. Estudo, sou mestranda, trabalho, trabalho e trabalho. Tento preparar a minha auto sustentação, para parar de chuchar na chupeta amarga do estado. Ele não me suporta, mas eu, com certeza também não o estimo. Dou tudo de mim, os meus pais dão tudo de si, para que eu consiga conciliar a minha vida com a vida da deficiência e do estado. Uma estudante louca, uma mãe atriz, diretora e produtora, um pai músico-compositor-engenheiro de som-empreendedor. E um estado que nada me quer. Um estado que me apaga com borrachas de sertralina, pregabalina e triticum.
Eu?
Não me suporto.
Antes de mais, permitam-me este momento de fangirl: OS 30 SECONDS TO MARS ESTÃO DE VOLTA A PORTUGAL, AHHHH!!
Por muito fã que eu seja da banda, infelizmente nunca tive a oportunidade de os ver ao vivo. Mas no fundo do meu coração, sempre soube que eles voltariam ao nosso país para mais concertos. E, portanto, quero naturalmente ir assistir a este concerto! 10 de abril do próximo no ano no Campo Pequeno.
Até aqui tudo normal, certo? Até que...
***
Por muito contraditório que possa parecer, gosto de dizer que as nossas fraquezas são uma fonte de força e firmeza. Era eu ainda uma criança que nem sequer sabia o que Marketing queria dizer, quando já fazia uso à expressão "em cada problema está uma oportunidade". E é disto que se trata a gestão das nossas fragilidades. Sou deficiente desde que comecei a ter consciência da minha pessoa, e em 20 anos de existência em nenhuma vez fui eu vítima de qualquer tipo de bullying, quer seja físico ou psicológico. Porquê? Nunca me escondi ou neguei. Era e sou simplesmente eu, como sou, nua e crua.
Deficiente, def, tecla 3. O que quiserem chamar. É a minha
realidade. Sou deficiente. Mas sabem que mais? As pessoas conseguem ser
preconceituosas com os próprios preconceitos. Ser-se deficiente não é uma ofensa, é um facto. O corpo humano não é
perfeito, tem falhas.
Passo a explicar melhor:
- Muitos dos deficientes motores têm necessidade obrigatória de UM acompanhante (o meu caso) para necessidades básicas (idas à casa de banho, refeições, ajuda para aparelhos respiratórios, etc etc.);
- Na maioria dos sítios o acompanhante é obrigado a pagar, quando na realidade vai apenas e somente para ajudar a pessoa deficiente;
- Na grande parte dos recintos de espectáculos (concertos ou não), apenas existe um local específico para pessoas com mobilidade reduzida. Acontece também muitas das vezes esse lugar ficar ao lado dos lugares vip's e por isso ser mais caro do que os outros, não dando à pessoa opção de escolha.
- Exemplo real (meu caso): Há 2 anos fui ver o Lisbon Film Orquestra (lindo, lindo! adorei embora os percalços) que actuaram no teatro Tivoli em Lisboa. Os únicos lugares acessíveis para pessoas em cadeira de rodas eram uns camarotes que estavam na plateia de baixo. Como eram camarotes, o preço era o mais caro que estava à venda. Fui portanto, obrigada a ir para aquele lugar e ainda mais a ter de pagar o bilhete mais caro (tanto eu como o meu acompanhante). Para terem uma noção, o bilhete mais barato era 5€ e o mais caro 15€. Se eu quisesse ir para um lugar a 5€, não me deixariam. É verdade, isto aconteceu mesmo...
Pondo as cartas em cima da mesa, interrogo-me se estas políticas são as mais correctas e justas...
Fiz o meu 'trabalho de casa' e descobri que em Inglaterra tanto o acompanhante não paga, como existem lugares específicos para pessoas com mobilidade reduzida espalhados por TODO o recinto, com diferentes preços e com as devidas acessibilidades e segurança. Se eu quisesse ir a um concerto e estivesse interessada em pagar o bilhete mais barato, teria um lugar certamente mais atrás com uma menor visibilidade. Mas caso eu quisesse ir para as primeiras filas (coisa que cá em Portugal já me impediram várias vezes de o fazer...), teria também lugares apropriados e o preço seria logicamente mais caro.
Obviamente que com a benesse do acompanhante não pagar, haveriam sempre uns cromos a aproveitar-se disso, sobretudo porque vivemos num país de chicos espertos! Fiquei contente com a maioria das respostas que obtive no meu questionário. Deram também o exemplo das crianças. Têm razão! As crianças também precisam de um acompanhante (nem vou pegar na questão de que os espectáculos para crianças não são só feitos para elas. sobrevivem sobretudo à custa de famílias! incluindo avós eheh) sim senhora, e não existe benesse para estes. No entanto há que lembrar que provavelmente daqui a 10 anos essas crianças já devem poder ir sozinhas as concertos, enquanto os deficientes, serão deficientes para todo o sempre! ;)
Caso eu prossiga com a ideia de fazer uma petição pública para tornar esta situação mais 'justa', espero poder contar com a vossa assinatura!
Confesso que não sou propriamente uma rapariga de sair à
noite. Sempre curti mais a onda de bares com música ao vivo (sou louca por
irish pubs!). Mas com a minha entrada na faculdade (Universidade Europeia, no
curso de Marketing, Publicidade e Relações Públicas), não queria deixar de
comemorar esta minha grande nova etapa. Portanto, decidi ir à Recepção ao
Caloiro de Lisboa (RAC)! Apenas fui um dia, onde o cantor Agir foi actuar (foi
o único nome que me chamou mais a atenção).
Assim que cheguei às portas das bilheteiras, assustei-me.
“Onde é que eu me vim meter?!”. Havia pessoal que ainda nem sequer tinha
entrado no recinto e já estava mais para lá do que para cá… Entretanto chegou a
minha “companheira”. Ela estava de
moletas… Passamos boa parte do tempo a rir com a nossa figura: eu de cadeira de
rodas e ela de moletas! A dupla implacável.
Entrámos lá para dentro e fui à procura do pessoal do meu
curso, mas ainda só tinham chegado muito poucas pessoas. Decidimos então ir
para a frente do palco (onde estava a tocar um daqueles Dj’s baratuchos). O
recinto estava ainda muito vazio! Assim que o Dj acabou de tocar, um aglomerado
de pessoas começou-se a juntar ao palco. Não me atrevi a ir para o meio da
plateia, pois nunca se sabia o que poderia acontecer. Estava colada às grades
do lado esquerdo do recinto! Mal tínhamos acabado de “estacionar” veio logo um
grupo de paramédicos falar connosco! Quiseram-nos pôr à vontade, dizendo que
havia vários núcleos de seguranças e paramédicos espalhados pelo recinto,
nomeadamente um mesmo ao pé de nós! Senti-me logo super protegida. O medo
desapareceu logo! Despediram-se de nós com um simpático “divirtam-se”.
Finalmente o Agir tinha entrado em palco. Foi a loucura
total. Na altura do meu 3º ciclo, era uma fã incondicional dele…
Cada minuto que passava, mais gente se começou a juntar e a
apertar contra as grades. Se tive medo? Um pouco. Mas tive sorte nas pessoas
que ficaram ao meu lado! Faziam parte do grupo dos “weedados”. Sim, porque há
dois tipos de pessoas nas festas (sem contar comigo, claro. Haha!):
os weedados (ou ganzados, como preferirem) e os bêbados.
Eu estava mais com medo dos “bêbados”, pois esses perdem
mesmo toda a noção do presente, e sabe-se lá o que me poderia acontecer. Havia
lá pessoas que até metida dó… E dá sempre azo à violência e ao descontrolo… Que
eu simplesmente detesto.
Mas os weedados são os fixolas! Estão sempre na boa, têm
cuidado comigo, nada de moches ao meu lado, tudo muito “peace and love”.
Comecei a entrar em stress quando o Agir pediu ao público
para fazer aquele “jogo” de toda a gente correr para o lado direito e depois
para o esquerdo. Pensei logo “isto não vai dar bom resultado”. Estão-me a
imaginar a “andar” na cadeira para um lado para o outro no meio daquela
multidão? É que eu não estava minimamente. Mas para meu espanto, a malta ao meu
lado criou que um espécie de bolha protectiva sobre mim e a minha amiga.
Conseguimos ficar no nosso lugar sem sermos esmagadas! Espectacular.
No final (depois de um pequeno percalço) tive direito a ir
ao backstage. O staff foi super atencioso comigo. Acho que ao longo dos
festivais a que já fui, nenhum deles me tratou tão bem como a RAC’14! Tive
direito a uma fotografia com o Agir e acompanhamento “vip” até à saída (para
não ter de passar pela multidão, fui pelas traseiras das barraquinhas que lá
haviam).
Foi sem dúvida uma grande noite e começo da minha vida
universitária! Os meus parabéns a todo o serviço da RAC’14 (que todos os outros
festivais ponham os olhos no exemplo deles…).